Finalmente nos dirigimos ao salão.

Meus olhos extasiaram-se: eram muitos lustres de cristais brilhando, na medida exata para deixar o ambiente entre o deslumbre e o aconchego.

Era uma festa na qual os convidados sentavam-se.

Antes, de pé, íamos flanando entre os demais.

Eu já conhecia alguns através do Zeka.

Juntos, então, falávamos frivolidades.

Aos poucos, integrei-me àquela atmosfera, ao cenário, ao evento, no qual já não era uma estranha.

Enxergava cada vez mais.

De forma bem melhor, via quem e como eram as pessoas, com seus estilos, suas ações.

Os fatos que compreensívelmente sempre pedem nossa interpretação.

As mesas, cobertas de organdi, com os mais caprichados bordados que eu já tinha visto.

Sem deixar de citar os candelabros e os talheres, também de ouro.

Como eram mesas marcadas, eu sabia que iria sentar-me com Lúcia, o marido e mais dois rapazes.

De antemão, estava informada de que um era investidor e o outro tinha como hobby caçar na África, onde possuía uma fazenda.

Resolvi ficar entre os jovens, como eu.

Estiquei o máximo de tempo que pude por ali, conversando, rindo, tomando champanhe.

A princesa estava fazendo 21 anos.

As festas na Europa são bastante pontuais.

Assim, às 20h30min já haviam entrado todos, absolutamente todos os convidados.

Fomos então avisados para sentarmo-nos às mesas postas.

Pensei: "ainda bem que não falei antes com os moços que sentaram à nossa mesa!

Assim, não gastei a conversa".

Com o investidor? Nem pensar! Nunca fui boa com números, nunca a matemática financeira foi minha praia. Sempre gostei é de numerologia.

Já o caçador, bem, poderia funcionar...

Ele me interessava.

Eu tinha o sorriso de Mona Lisa pronto para brotar no rosto e me salvar em meio às informações de que não dispunha.

Homem bonito, o caçador, tinha também um assunto mais fácil de ser enfrentado.

Bastava eu perguntar sobre o dia-a-dia nas fazendas da África, como funcionavam, que raça tinham os gados que criavam e quais eram as culturas principais da região.

Enquanto ele explicava tudo, eu ganhava tempo.

Ia me inteirando daquela realidade, entrando num novo mundo.

Ficava sabendo, assim, sobre mais um território exótico da Terra.

Como eu havia levado o almanaque do ano (com informações de todo o mundo) para Paris, dei uma estudadinha sobre a África, muito proveitosa, por sinal.

Logo que sentamos, violinos russos começaram a tocar, indo de mesa em mesa.

De repente, as luzes se intensificaram, e apareceu no salão a família real do Marrocos.

À frente vinha a princesa, num belíssimo vestido, obra-prima da alta costura, com um toque meio árabe, de arabescos bordados.

Todos levantamos para saudar a família que adentrava
o recinto.

Senti olhares ansiosos dirigidos diretamente para mim.

Quando os identifiquei, vi que eram do príncipe que acompanhava a irmã.

Os presentes saudavam com taças de cristal, com o champanhe do mesmo nome.

Eu não estava sonhando, eu entrara para o mundo das fadas e dos gnomos, das princesas que dormiam por séculos até chegar seu príncipe encantado...

Eu estava celebrando a minha vida até ali, através das histórias que minha mãe contava.

Eu estava vivendo mais uma noite de Sherazade, só que desta eu participei.

Sentamo-nos e logo a aniversariante e seu irmão começaram a caminhar entre os comensais, saudando convidado por convidado.

O príncipe, enquanto a irmã parava nas mesas, saía rapidamente do lado dela e ia para onde eu estava.

Falava com Lúcia enquanto, simultaneamente, me olhava, fazendo daquele jantar um longo jogo de sedução.

Tive que ir aux toillete, era necessário caminhar um pouco, através de largos corredores.

Quando saí, lá estava ele.

Me pegou em seus braços, olhando-me profundamente com uma expressão difícil de narrar.

Foi então que me deu um suave beijo.

Fui acordada de muitos séculos.

Como eu ainda trazia o sofrimento de um amor perdido no Brasil, na verdade não tinha intensão nenhuma de ter outro.

Eu só estava contemporizando o que havia vivido até aquele momento.

Além de ficar lisonjeada, foi o instante da realização de tudo o que eu vivera.

Mas meu coração bandoleiro sabia que este era o mundo que eu tinha descoberto e encarado até ali.

Depois...

Senti esse ciclo encerrar-se com chave de ouro.

Meu espírito ávido de espaços e ação avisava:

"Caminante, no hay caminos, / se hace camino al andar"
(Antonio Machado).

Se eu estava lá para sair da minha redoma, senti que ainda estava nela, portanto, na minha mesmice.

Olhei para o príncipe e selei um pacto com a vida: eu estava pronta pra ela!

Os meus caminhos começavam a acontecer, dentro da liberdade que eu me permitia.

Agora, vou parar de escrever, e voltar para a festa!

























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1 comentários:

    clarice ge disse...

    Fiquei pensando... Marta já estava desenhando sua história, mesmo antes de vive-la.

  1. ... on 11 de outubro de 2009 às 17:24