1995
No ônibus, observava o horizonte pontilhado de coxilhas, logo despontaria a luz do amanhecer.
Procurei dentro de mim a consciência de vidas passadas e só vi expatriados da Rússia, pais da minha mãe, e da Alemanha, como meu pai.
Meus avós na Alemanha |
Família de Jango com ele na Fazenda. |
Dentro da mala existia um bom pedaço da história do Brasil. Muito triste, eu ainda chorava a morte de meu marido, e de minha mãe, falecida no mesmo ano.
Duas perdas. Como iria encontrar minha felicidade, se meus dias estavam sem cores?
Tinha uma filha em plena adolescência para cuidar, amar na solidão que a ausência do amor perdido só fazia aumentar.
A mala, abarrotada, parecia trazer muito mais perguntas que respostas.Viro de lado e me preparo para logo descer em São Borja.
Com a luz tênue das seis horas da manhã, desembarco naquela rodoviária adormecida de muitos séculos de história.
Carregava meus tarôs e meu CD-Player, onde escutava músicas new-age e indígenas, para entender melhor o lugar que tanto desejava ser acolhida.
Novamente renasço do ventre, desta vez da História do Brasil, para entender a grandiosidade de Getúlio e Jango.
A terra tem todos os registros. E é ali que eu coloco os meus pés, o meu coração, para saber de onde vem a fonte para o meu futuro. Acordo no quarto que ocupo no Hotel Charrua.
Observo pela janela a pracinha em frente tomada de passarinhos gorjeando. Diante de mim, noto uma casinha de joão-de-barro.
Meu cenário é calmo e ao mesmo tempo inquieto.
Pergunto olhando pela janela a camareira que estava me levando o café da manhã no quarto:
Qual é a história do João de barro?
"Com o olhar perdido na casinha dele,ela começa a me contar lentamente daquele jeito de falar bem marcado, forte de gaúcho.
Será esta história que eu abraçaria como meu aprendizado de vida entre aquelas coxilhas nos pampas?
Sabia que aquela era a primeira de muitas...
Eu procuraria todas as respostas na natureza entrando em contato com seus habitantes?
Minha amiguinha aparece com seus cachinhos dourados, seu olharzinho maroto e diz: Amiga abra esta mala de papéis, não esqueça de andar aqui com o povo da terra.
É a sua vez... daqui pra frente te deixo alguns anos sozinha, procura teu mestre interno, não perca nunca a tua coragem e os teus objetivos pois no final tudo dá certo!
Me despeço dela já empossando a chave da minha vida. Quem iria trilhar o meu caminho?
Boto uma musica indigena para entrar no clima de guerra, sabia que assim seria... e abro a mala de papéis ou talvez dos sonhos...
Nas lembranças e nos pensamentos, me vi sentada naquele ônibus, solitária, cabeceando de sono, olhando mães com seus indiozinhos no colo.
Segundo a lenda, há muito tempo, numa tribo do sul do Brasil, um jovem se apaixonou por uma moça de grande beleza. Jaebé, o moço, foi pedi-la em casamento.
O pai dela então perguntou:
Que provas podes dar de sua força para pretender a mão da moça mais formosa da tribo?
- As provas do meu amor! - respondeu o jovem Jaebé.
O velho gostou da resposta, mas achou o jovem atrevido, então disse:
- O último pretendente de minha filha falou que ficaria cinco dias em jejum e morreu no quarto dia.
- Pois eu digo que ficarei nove dias em jejum e não morrerei.
Toda a tribo se admirou com a coragem do jovem apaixonado. O velho ordenou que se desse início à prova.
Então, enrolaram o rapaz num pesado couro de anta e ficaram dia e noite vigiando para que ele não saísse nem fosse alimentado.
A jovem apaixonada chorava e implorava à deusa Lua que o mantivesse vivo. O tempo foi passando e certa manhã, a filha pediu ao pai:
- Já se passaram cinco dias. Não o deixe morrer.
E o velho respondeu:
- Ele é arrogante, falou nas forças do amor. Vamos ver o que acontece.
Esperou então até a última hora do novo dia, então ordenou:
- Vamos ver o que resta do arrogante Jaebé.
Quando abriram o couro da anta, Jaebé saltou ligeiro. Seus olhos brilharam, seu sorriso tinha uma luz mágica. Sua pele estava limpa e tinha cheiro de perfume de amêndoas.
Todos se admiraram e ficaram mais admirados ainda quando o jovem, ao ver sua amada, se pôs a cantar como um pássaro enquanto seu corpo, aos poucos, se transformava num corpo de pássaro!
E foi naquele exato momento que os raios do luar tocaram a jovem apaixonada, que também se viu transformada em um pássaro. E, então, ela saiu voando atrás de Jaebé, que a chamava para a floresta onde desapareceram para sempre.
Podemos constatar a prova do grande amor que uniu esses dois jovens no cuidado com que o joão-de-barro constrói sua casa e protege os filhotes.
Os homens admiram o pássaro joão-de-barro porque se lembram da força de Jaebé, uma força que nasceu do amor e foi maior que a morte."
Vamos então!
O sol não brilha ainda na fronteira oeste. Aprendi que o sol nessa região só começa ficar mais intenso perto do meio dia...
O sol não brilha ainda na fronteira oeste. Aprendi que o sol nessa região só começa ficar mais intenso perto do meio dia...
2 comentários:
Marley disse...
Olá minha querida. Passeando pela net ,blogueira assumida,resolvi pesquizar se existia algum blogueiro em São Borja.Nasci,me criei e vivi muitos anos da minha infância lá. Fiz muito pique-nique nas fazendas do Jango e do Getulio que segundo meu falecido pai era nosso parente.Encontrei teu blog e achei muito interessante,vou seguir.A estória me interessa,sou muito curiosa hehe.Logo estarei aqui de novo.Se quizer da uma passada no meu cantinho: http://mmdorneles.blogspot.com
Beijo e um final de semana muito produtivo
Marta Schönfeld disse...
Guita Braude MARTINHA QUERIDA ESSA CRONICA FASCINANTE E ESSE MARAVILHOSO VIDEO, FIQUEI ATE SEM PALAVRAS SABE PORQUE? O RELATO QUANDO TE CONCENTRAS, PARECE E TU SENTES QUE E SOBRE A TUA PESSOA QUE ESTAO RELATANDO E O VIDEO E DOS INDIGENAS ACHO QUE TUDO E RELACIONADO NESSE CASO.EU ADMIRO E RESPEITO AOS INDIGENAS,SAO UM POVO BRAVO, CORAJOSOS E PERSEVERANTES IGUAL A TI E A TUA CRONICA. A TUA VALENTIA E O QUE SERVIU DE BASE PARA A TUA CONTINUIDADE E PARA ESTAR COM TUA AMADA FILHA E AMADA NETA, PARABENS QUERIDA, POR MAIS ESTA BELA VIAGEM PELO TEMPO, BJS. COM CARINHO!